9.12.09

A menina do cachorro

A menina conversava com seu cachorro, sentada na grama da pequena praça daquela pequena cidade sob a sombra de uma grande árvore; discorria sobre qualquer coisa não muito importante e seu cachorro a acompanhava num outro ritmo, constantemente mudando de lugar. Eram conversas divertidas e ele era realmente um bom amigo e sempre quando as lições de casa permitiam, não recusava o momento. O cachorro, por não ser humano, não tinha medo de trocar dezenas de "eu te amo" durante o dia... a menina era tudo para ele e ela retribuía o sentimento (sem, claro, a mesma empolgação).

A árvore sob a qual sentavam cresceu e envelheceu, mas continuavam na sua rotina-não-certa de sentarem para conversar sempre que podiam. Muito embora ela podia muito menos. Sobre o tempo do cachorro, não precisa se discutir... afinal, fora se aventurar a cheirar coisas novas e observar as pessoas passando (de vez em quando latir para outro cachorro), não tinha muito o que fazer. Mas a menina, esta acompanhou o crescimento da árvore e com isso as responsabilidades aumentaram e o tempo começou a ficar mais curto. Não tinha grandes preocupações (nem mesmo pensava muito em meninos) e as conversas esporádicas com o cachorro a faziam lembrar do que era realmente importante. Eles ainda trocavam seus "eu tem amo"s

O cachorro começou a perder o ânimo. Não por dentro, onde sempre se via empolgado, mas o corpo já não acompanhava a mesma alegria e euforia. Mesmo assim, esperava pelos momentos com sua dona, porém mais requieto... ela era tudo para ele. Ela, contudo, virou bela moça, com outras responsabilidades. Gostava do cachorro, mas tinha agora várias amigas e amigos, além de vários outros interesses. Suas conversas eram bem mais curtas, normalmente o cachorro que perguntava do dia dela e tinha respostas breves, quando não monossilábicas. O cachorro, por ainda ser cachorro, não tinha medo de dizer para ela que a amava. Ela retribuía, mas sem o mesmo brilho nos olhos. Ela só ficava novamente empolgada, quando era acompanhada de alguma amiga nas conversas com o cachorro - já consideradas ocasionais - e este, com toda a paciência, suportava ser ignorado por algumas vezes e se contentava com o carinho que ainda não faltava.

Chegou o tempo em que deitar era quase tudo o que conseguia fazer e a própria visão esvaía. Levantou como pode, andou até a árvore já velha e sentou, observando o seu último por-do-sol. Estava sozinho. Muita gente podia tomar essa situação como injusta ou ultrajante, mas gente ele não era, era cachorro. Só agradeceu ter vivido (e da melhor maneira que pode). Amou a vida inteira.

5 comentários:

  1. Anônimo9.12.09

    As vezes eu me pergunto: será que esse cachorro era mesmo tão bonzinho assim? Dizer que ama, é o mesmo que amar?

    Vamos pensar um pouco sobre isso?

    ResponderExcluir
  2. Uau levi,

    lembro-me da minha relação com minha cachorrinha...

    =(

    belíssimo texto!

    Acredito que o cachorro amou a vida inteira, e dói imaginar como o ser humano se esfria com o tempo, e vai deixando desgastar os mais belos sentimentos. Penso como o cachorro foi humano, e a humana foi institiva nesse texto.
    Amei!

    ResponderExcluir
  3. A solidão assusta pouco a quem muito ama.

    ...

    Belo espaço o seu. Foi um prazer encontrar meu link aqui. Obrigada, sim?
    [A propósito, foi você o Levi que fez um comentário no meu blog a algum tempo?]

    Até breve.

    ResponderExcluir
  4. Anônimo15.12.09

    O cão não "diz que ama" apenas.
    O cão ama.
    Vê-se isso porque está lá.
    Até o último por do sol.
    Esperando.
    Quanto à menina, perdera-se entre os devaneios adultos.

    ResponderExcluir
  5. Anônimo23.12.09

    droga mellon!!! não posso ler coisas que animais morrem que viro mais manteiga que o normal.
    seu segundo texto que chorei, poxa. =P (o primeiro foi o do natal, fiquei emocionada com a bela comparação ^^)
    Você escreve tão bonito, mellon (:

    o texto ta lindo. coloque-o no seu livro de contos futuro (;

    beijinhos ♥
    mellon Má- ok, sua única mellon- acho UEHEUEHUE

    ResponderExcluir