Vestiu-se e arrumou sua bagagem. De sandálias nos pés, saiu da pequena casinha de barro, agradecendo à família que gentilmente a cedeu para aquela noite, indo em seguida rumo ao cais. O movimento na pequena cidade litorânea era de um ritmo preguiçoso. Comerciantes iam montando tranquilamente suas barracas, na esperança de um grande dia de vendas, via-se algumas mulheres aproveitando o clima ameno do começo de manhã andando em direção ao poço, carregando habilmente quantas jarras um ser humano seria capaz de carregar (francamente, poucos humanos seriam capazes da façanha daquelas mulheres), e algumas crianças, que não podiam perder um segundo de seus dias, eram responsáveis pela agitação maior da manhã. Não demorou muito e Merkill chegou ao cais, passeando com seus olhos pelo horizonte, a fim de encontrar o homem que lhe prometera uma embarcação, mas acabou se distraindo com o mar azul turquesa que brilhava a luz do Sol Leste, que encostava de maneira suave nas ondas, como se as acariciasse, praticamente paralela com estas.
Enfim, viu uma embarcação quase solitária sendo preparada por um homem franzino de cabelos brancos, que puxava uma rede já gasta de dentro do pequeno barco de madeira, já que o pescador não iria pescar. Merkill achegou-se a ele, ajudando-o a terminar a última tarefa.
-- Está pronto! - comentou o velho homem - Tem certeza que quer este barco?
-- Não... E sim. Algo me diz que me darei bem com ele. - respondeu Merkill, complementando com um sorriso.
-- Bem, então aqui vão algumas instruções sobre o barco...
-- Creio que não preciso, - interrompeu Merkill - já naveguei muitos barcos, e este não me parece muito diferente ou especial...
-- Jovem, escute-me! Ele é mais especial do que se pode imaginar. E creio que vai ser de bom uso para o fim que deseja, pelo o que você me contou. - após um silêncio confuso do pescador moreno, o velho dono do barco continuou - O barco não gosta de ser comandado. Você tem que deixá-lo fazer tudo!
O pescador ainda ficou um tempo discutindo com o velho, não entendendo muito o que quis dizer com isso e assegurando-o que era um grande marinheiro. Mas o velho insistia com seu conselho, enfatizando-o mais uma última vez:
--Deixe-o fazer tudo, meu jovem!
Merkill lançou um sorriso irônico e pulou para dentro do barco, contente por finalmente poder viajar e cansado de conversas malucas. Como para contentar o velho (ou para não ser novamente importunado por suas idéias nada convencionais), deixou que o barco deixasse sozinho o cais, partindo rumo ao Sol que fugia das águas, subindo lentamente aos céus. Mas uma vez que não se via mais o velho (ou não podia mais se ouvi-lo), Merkill começou a comandar o barco e ajeitá-lo conforme a sua sabedoria de muitas viagens pelo mar. Realmente ele não mentia quando dizia ser um ótimo marinheiro. Alguns diriam que tinha uma habilidade surpreendente para alguém da sua idade.
Por algumas horas, tudo pareceu correr bem e não se pensava mais no velho de cabelo grisalho, mas veio então, sem avisos, uma enorme tormenta, de forma que o pequeno barco quase virou e sucumbiu severas vezes. O pescador lutou coma tempestade por tanto tempo que perdeu a contagem dos dias. Seus músculos encontravam-se tão fatigados que a cada movimento, parecia-lhe que o sangue que fluia no seu corpo transformava-se em metal e rasvaga suas veias, dos braços à ponta dos pés. Por fim, a tempestade passou, mas o velejador não sabia mais o quanto havia navegado, nem sequer uma pista daonde estava, além de não encontrar forças nem sequer para pensar e tomar decisões. Foi quando as palavras daquele velho do cais lhe pareceram mais atraentes e menos loucas.
-- Desisto... faça tudo, então... Disse numa voz fraca e depressiva, quase inaudível.
De repente, ao soltar de vez as cordas da vela do barco, este inclinou-se bruscamente à esquerda seguindo o Nordeste. Merkill assustou-se, e por instinto esticou os braços para tomar novamente o controle do barco, mas algo o impediu. Se hoje perguntarmos para ele o que o impediu de tomar posse novamente daquele barco, vreio que não saberia responder, mas o importante é que seus braços foram freiados e em seguida recuaram para junto ao peito. Estava muito cansado. Virou-se e dormiu, deixando que o misterioso barco fizesse o resto.
Também não se soube por quanto tempo dormiu. Horas ou dias. Mas ao abrir os olhos, encontrou algo que não via há algum tempo: terra. Não apenas terra, mas a terra a que se destinava. Sentou-se curioso e animado, tocando o barco, como se tentando descobrir seu segredo em seu casco. Desistindo, levantou os olhos e sorriu. Pegou suas malas e desceu, agora só resta continuar...
letrista e futuro tolkien brasileiro. é, não me canso de afirmar isso. você é ótimo, Le! (:
ResponderExcluironde estao os capitulos anteriores? e eu quero os proximos....
ResponderExcluirbjus
camila