26.12.09

Natal - parte 3

Passava o dedo na borda da xícara apreensivamente com movimentos não tão contínuos; o dedo parecia confuso, não sabia ao certo para que sentido se moveria, alternando várias vezes entre horário e anti-horário. Sempre achou que em momentos como esse, ouviria os passos do relógio, no entanto, conseguia escutar apenas os carros na rua e um pouco dos rumores da conversa da vizinha: provavelmente fofoca... nunca se viu uma vizinhança fofoqueira como essa, ninguém merece! Quando mudei-me para cá, achei que seria um canto sossegado, exatamente como precisava... como preciso... mas não completou-se direito uma semana e todos já sabiam da minha história! Deve ser aquela empregada... devia demiti-la, isso sim... se bem que ela limpa muito bem... e é Natal... bem, quem sabe depois; espero mais uns poucos meses e mando ela para rua! Prefiro alguém em que posso confiar minhas palavras do que confiar meus carpetes.
Enfim, o tão esperado som enche a sala com suas vibrações irritantes. Os dedos, que antes dançavam feito loucos desnorteados adquiriram instantânea sobriedade e avançaram ao telefone amarelo - este que se encontrava fora de seu devido lugar, do lado da xícara de chá.

- Alô... sim, sou eu, delegado, pode falar... sim... aham... mas, isso... não, claro, entendo, mas... isso... seu delegado, isso quer dizer alguma coisa... de verdade? Quer dizer, já estamos procurando faz tempo e, sei da sua capacidade, mas e se ela já tiver saído da cidade? Vocês vem com vários palpites, mas nenhuma pista concreta, você me entende? Daí a gente fica com uma expectativa, sonha, se preocupa, mas nunca dá em nada... - a voz dela começava a definhar, num choro trêmulo e tímido - e estou cansada... não quero mais me frustrar, ficar procurando e não achar...

Ela parou por um momento, tomando fôlego. O coitado do delegado no outro lado da linha não sabia o que falar. Ele também não acreditava mais. Normalmente, elas voltam dentro de duas semanas, mas já tornou-se questão de meses... nem sequer uma ligação... talvez o melhor seja não encontrá-la... uma filha assim... Trocaram suas últimas palavras, como se estivessem se despedindo num velório e desligaram.
Renata inspirou profundamente e soltou o ar aos poucos, enquanto abria os olhos e enxugava as tímidas lágrimas que ousaram aventurar-se. Pegou bolsa, celular, chave. Ao passar pela geladeira deparou-se com um convite de sua irmã. Alcançou-o com sua mão incrédula: "Talvez seja bom ter alguma coisa para fazer à noite".

***

Sabia que sua madrasta dissera alguma coisa, mas os fones de ouvido continuavam imóveis e a sua voz misturava-se com o barulho da música. A mistura até que não era ruim... a música também. Os olhos inertes reagiam apenas à mudança de cores na tevê. A mão também sofria com a inércia da troca constante de canais. Estava cheio, lotado. Não conseguia absorver mais nenhum imagem. Ou som.
Um ritmo persistente começou a invadir a música. Crescia cada vez mais, tornando-se estridente até ser reconhecido: atendeu o celular. Algumas monossílabas pronunciadas, uma olhadela no relógio e despedida. Buscou a mochila, que não estava longe, ajeitou o fone que caíra da orelha direita, murmurou algo para a madrasta que retrucou avidamente. A porta bateu - com ele para fora.

***

Assim que sentiu o chão, ouviu a música da cidade: pessoas caminhando de volta para casa, carros apressados carregados de presentes, o choro do homem às suas costas. Olhou para suas mãos dilaceradas com espanto. A face distorcida do homem em prantos o afastou daquele lugar. Não lembrava da última vez que seu coração bateu tantas vezes com tamanha intensidade; ele se arremessava contra seu peito, numa desesperada medida para fugir e sentir ele mesmo a realidade que o cercava. Foi somente depois de vários passos que percebeu estar sem os fones de ouvido. Agitou-se, desconsolado, imaginando se o fone ainda estaria lá, revolvendo em sua mente os diversos fins que poderia ter tomado, enquanto suas pernas batalhavam para decidir se iam em busca dos fones ou não. As ideias iam tomando forma e se concretizando à medida que o tempo passava. Seu pé ainda não havia cessado de bater ansiosamente no chão, apressando a mente a tomar uma decisão. Mas, enfim, uma grande nuvem dissipou-se, permitindo-lhe finalmente decifrar os milhares de pensamentos que lhe ocorriam constantemente. Conseguiu ouvir a si mesmo como nunca antes conseguira.
Após mais alguns passos, seus olhos depararam-se com uma menina de cabelos negros, encostada no muro de um prédio que dava num beco. Seus olhos azuis contrastavam com o cabelo escuro e a pele clara. Suas roupas estavam amassadas e apresentavam insegurança. Havia uma luz diferente naqueles olhos, como se o céu inteiro coubesse neles. Sem querer, quis abraçá-la.
Devia ter ficado muito tempo observando-a, porque ela reagiu de maneira crespa, como se Gustavo a tivesse invadido de alguma forma. Desculpou-se e obteve um tudo bem como resposta. Nunca soube dizer mais tarde exatamente o porquê, se foi a vontade anterior de segurá-la ou o recente reencontro com o mundo, mas fez o que não imaginaria:

- Você parece chateada. Ela redirecionou o olhar, curiosa.
- Não é nada. Passaram-se alguns segundos e se arrependeu da resposta.
- Então... vou indo...
- Quer dizer... você sabe quando... fez uma breve pausa, mas respondeu decididamente. Estou perdida. Ele pareceu não entender, mas procurou em seus pensamentos qualquer resposta que pudesse ajudá-la.
- Eu conheço esses arredores, posso...
- Não - interrompeu a menina - não nesse sentido. Seu olhar nunca o encarava e suas mãos estavam inquietas. Eu fiz algumas escolhas erradas... minha vida não era perfeita, nem um pouco... mas ficou muito pior, entende? Eu... eu esperava ser tudo diferente, ter encontrado o que queria, eu achava que ia ser feliz... mas as coisas... elas deram muito errado... e já não posso voltar atrás... eu não sei mais se consigo dormir em paz. O menino poderia esperar qualquer coisa, menos tamanho desabafo. Ele mesmo sentiu impulso para que contasse as suas próprias frustrações, mas algo o impediu.
- Está escurecendo. Acho melhor sairmos daqui, é meio perigoso. Ela assentiu. Passaram alguns segundos sem que ninguém falasse nada. A cada segundo o menino se obrigava mais a soltar as primeiras palavras. Ela estava contente apenas em estar acompanhada. Pelo menos sentia grande alívio; começou a soltar os grilhões.
- Eu... eu... eu moro com a minha madrasta. Não lembro da minha mãe e meu pai morreu já faz um tempo. A paz que começara a tomar espaço no interior da jovem estremeceu ao ouvir "pai". Ela é OK.
- Não vejo meus pais há dois meses. Quer dizer... deixa pra lá. Seu rosto permaneceu admirando os calçados.
- Você... não quer vê-los?
- Não... eu... quero, mas... é complicado.... acabei de ver meu pai, na verdade. Gustavo, de alguma forma, sentiu que não deveria perguntar mais fundo. Mudou de assunto, e assim ficaram por um tempo, se alimentando do mundo. Até que, já escuro, depararam-se com uma construção bem iluminada e movimentada. Chegaram mais perto, mas ainda não conseguiram decifrar o que era aquilo ou o que aconteceria, viam apenas que as pessoas conversavam e sentavam, aguardando uma apresentação. A proteção das luzes os atraiu. Sentaram ao fundo, fugindo de quaisquer olhares. Estavam descansando um pouco de suas vidas.

24.12.09

Natal - parte 2

Acordou naquela manhã sem o despertador. Na verdade, quase não dormiu, mas procurou ver o lado positivo da situação e logo se pôs em pé, ignorando o espaço vazio ao seu lado na cama. Gostava de se sentir bem e se arrumar a fazia assim se sentir, então fez sua primeira parada do dia no banheiro. Escova de dente, pente, perfumes e outros mais, esteticamente organizados ao lado da pia, eram selecionados um a um pela mão delicada que fazia o melhor uso de cada um deles. A segunda parada foi no guardarroupas. Queria ser casual hoje, para isso não quero usar vestidos... ainda mais que as cores que tenho não combinam com esse dia. Uma calça jeans, sim... mas minha favorita está para lavar... Esta tem uma bela cor, mas não fica tão bem em mim quanto a outra... mas tudo bem, hoje quero cores, mesmo.
No mesmo ritmo escolheu a blusinha que acompanharia o resto do traje, saindo contente de dentro da porta branca que abrigava seu prazeres de cada manhã. Ah, a música! Esqueceu de escolher a música matutina! Vamos lá... devia baixar mais músicas, tentar novidades... ou quem sabe umas mais velhas... ah! Mas é claro! Como podia ter esquecido? É bom já colocar as músicas do coral, assim já me acalmo mais... Música do coral, então!
Por um momento, sentiu vontade de trabalhar, mas não podia. Trabalhar em feriado é desespero... Trabalhar a fazia bem, dava a ela um objetivo a cada dia, uma meta a ser alcançada. Facilmente se destacou no escritório, não só por sua beleza, mas pela determinação que demonstrava todos os dias, como se a empresa fosse realmente sua, como se fosse a sua razão existencial, mas não era... certo? Bem, gosto muito de me manter ocupada, de me sentir útil no trabalho, mas isso não me torna uma viciada... quero dizer, tenho outras coisas que me dão prazer, que me alegram, como... filmes! Sim, odeio ficar parada em casa à toa e um filme sempre preenche minhas noites... ah, e quando tiro uma noite para assistir a um filme, comendo calda de chocolate... hum, mas faz tempo que não faço isso... e se... não, hoje à noite não dá, é verdade... olha outra coisa que me agrada: o coral! Cantar é um dos meus maiores prazeres, certamente... adoro o frio na barriga das apresentações em público, me traz uma sensação de aventura! E o ambiente do coral da igreja também é ótimo... não sou muito íntima de ninguém, mas adoro conversar com as amigas... nossa... tenho poucas amigas... não me lembro de alguma que não seja do coral... por que não há mais mulheres no escritório?! Será que poucas mulheres gostam de contabilidade ou meu chefe é simplesmente machista? Ele é um cara legal... não é muito bonito, mas percebo que ele me olha de vez em quando... quem sabe... Céus! Ele é casado, Júlia! O que você estava pensando?... Por que... Por que ainda estou sozinha?... Pare de pensar nessas coisas, mulher!... E é bom mesmo que você esteja sozinha, veja sua irmã no que se meteu depois de tantos anos casada... Ah, me perdoe, me perdoe... não podia pensar uma coisa dessas...
O momento do café da manhã não a agradou como esperava e desistiu das fibras com iorgute. Desligou o som da música tradicional de igrejas na época de Natal e resolveu sair de seu apartamento, passear por algum lugar, fazer seu tempo passar... Não gostava de ociosidade, fazia-a pensar, e quando muito pensava, sempre algo ruim lhe aparecia em mente. Para que não corresse o risco, desceu as escadas cantando as músicas que tanto ensaiara, deu bom dia ao porteiro e andou rumo à... rumo à floricultura! Adoro flores durante a manhã... Cinco minutos de caminhada e... fechada. Bem, quem sabe uma simples caminhada não alegre meu dia.

***

Não sabia se era tarde, manhã ou noite. Manhã não deve ser. As luzes que transbordavam da cortina vermelha muitas vezes enganavam e ficara muito tempo no quarto. Um vento resolveu bater e revelar o começo da tarde, resvalando nas suas pernas nuas. Resolveu cobrir-se novamente, assim também se sentia mais segura, menos desvelada. Sentia-se suja e não queria que ninguém visse quão suja estava... por dentro. Nem mesmo Eric. Valia tanto a pena fazer tudo o que fez? Na hora as coisas parecem ser tão claras e óbvias, mas aqui... pensando... não faz tanto sentido assim. Seus olhos bateram na cômoda ao lado da cama e foi como se levasse um golpe na cabeça. Os restos de ontem ainda se encontravam lá, ao lado da vodka barata, e só de vê-los sentia-se cansada. Ao mesmo tempo, uma intensa dor, como uma saudade ruim, subiu pelo seu estômago, dando-lhe ânsia e vontade... não uma vontade certa, porque acho que no fundo não quero mais... mas por que me atrai tanto? Odeio ficar indisposta! É uma das que mais odeio! E isso sempre me deixa assim... a dor de cabeça também me atrapalha e o cheiro é horrível...
Por um momento, uma lágrima ensaiou cair pelas olheiras e sentiu-se fraca... e também forte... por um único momento, queria se rebelar como outrora fizera, mesmo que o tenha feito anteriormente para alcançar tudo o que tem agora. Tudo? Pensar no seu passado dava-lhe ainda mais dores de cabeça e esticou o braço para sanar todas as suas angústias. Era muito pouco em relação a ontem, mas era o suficiente para a manhã. Seu peito respirou intensamente e suas dores acalmaram, deixando-a em paz por mais alguns minutos. A preguiça invadiu-lhe o corpo, carregando junto o remorso. Sabia que estava errada, mas não se importava mais. Estava errada a tanto tempo que não fazia mais diferença... Era errada.
Não se sabe quanto tempo passou, mas o cérebro jazia morto enquanto os olhos sonolentos fixavam o carpete tosco. A boca estava aberta, pensou em fechá-la, mas não se importava mais. Nem sequer retirou do rosto a mão culpada. Assustou-se com o mover da porta e quando reparou em quem entrava ficou ainda mais emburrada: Eric.

- Ei gata...

Nenhuma resposta. Sentiu-se mais parecida com o seu pai.

- Tenho que ver uns negócios... tomar conta, sabe... vou voltar mais tarde, viu? Enquanto falava, vestia-se com a roupa de vários dias. Falava com a autoconfiança de sempre, a mesma que a conquistou... e que mais lhe dava raiva no momento. Era tão falsa! Achava-se tão superior aos outros, mas seu nojento bafo revelava apenas o começo da podridão de seu corpo.

- ...e daí a gente vai comemorar, gata! Vem cá, me dá um beijo... vem... um beijo! Eu quero um beijo... gata. Os dentes cerrados revelavam a ameaça. Virou-se e satisfez seu desejo. A sua mão podre a tocava e sentia nojo de si mesma. Não olhou no seus olhos uma única vez. Saiu, enfim... paz? Não... paz era algo que não experimentava há muito tempo... já faz uns bons meses... não podia ser tão ruim antes a ponto de preferir viver assim... ah! Mas ele era ridículo! Não conseguia falar uma palavra com aquele idiota! Como ele consegue me irritar tanto! Tenho tanto o que falar para aquele... aquele...

Depois de alguns minutos de silêncio, chegou à conclusão que tanto evitara por esses longos dois meses: sentia saudades... queria vê-los de novo. Fez um primeiro movimento: sentou na cama. Esperou um pouco e vasculhou com os olhos o quarto bagunçado e pouco iluminado, à procura de sua calça. Não achou. Mais alguns minutos e estava fora da cama. Sentou-se de novo, pensando se era de fato uma boa ideia. Afinal, o que falariam? Um grande medo a assaltou e trouxe as lágrimas que ficaram por tanto tempo presas no corpo frágil e magro. Tantas coisas passaram por sua cabeça que não conseguiu pensar em nenhuma delas, assim como quando se mistura todas as cores e forma-se o branco. Muitos minutos esperaram por ela, para que se recomposse. Decidiu: ia apenas vê-los, mas nunca falar com eles, não suportaria a vergonha. Foi achar sua calça na sala. Calçou o all star preto e o casaco que pegara de última hora quando fugiu de casa - era de seu pai, marrom, sua cor preferida, por mais que seja a cor mais ridícula para se preferir.
O apartamento do pai era mais perto, passaria depois na casa da mãe. Não sabia como ou se iria vê-los, iria apenas tentar. Andou de cabeça baixa e fazia tantos dias que não passava por aquelas calçadas que o cenário mais parecia um extenso dejá vue. Por todo o trajeto caminhava abraçada em si mesma, como se todo o mundo à sua volta estivesse pronto para julgá-la e a única coisa que pudesse protegê-la fosse seus próprios braços franzinos. Seu coração palpitou ao reconhecer as marcas na calçada: estava próxima. Os pés das pessoas passando a distraiam. Há pouco tempo, eram em sua maioria calçados populares, mas agora os sapatos executivos tornavam-se mais frequentes. Riu minimamente em seu interior ao ver um outro all star, mas este vermelho. Se houvesse uma jeito de escolher uma coisa que pudesse levar do seu quarto nesse exato momento, seria, definitivamente, seu all star vermelho. Calçou o preto não sabe por que e se arrependeu amargamente por isso.
Seus passos pararam de seguir o ritmo dos outros à sua volta e desaceleraram. Contou até dez e levantou o rosto. Em seguida virou-o à direita, na direção do prédio azul e branco do outro lado da calçada. Subiu os andares com o olhar até chegar no último e... nada. Uma parte dela sentiu-se aliviada, como se justificasse todos os seus atos. Mas não conseguia reunir forças suficientes para sair dali. As pessoas continuavam cada qual o seu caminho e o corpo da menina ainda menor de dezoito parecia buscar em cada uma delas um incentivo para deslocar-se. Sabia que bastava um passo e sairia dali rapidamente, mas algo a retinha, fazendo-a permanecer imóvel. Fechou os olhos e convenceu sua mente: uma última olhada e sairia. Seus olhos se abriram e buscaram a janela da cobertura com convicção. Sairia daquela calçada em instantes! Mas... pai? o que que ele... está subindo? Não! Assim que seus olhos se encontraram com os de seu pai, apoiado na temida janela, correu como há tempos não corria, finalmente encontrando o incentivo que tanto esperava para seus pés.

22.12.09

Natal - parte 1

É engraçado como não temos controle sobre nossas vidas. Como as coisas podem tão facilmente escapar das nossas mãos; tão rapidamente que nos desconcertam e nos tornam a realidade desinteressante. É engraçado como essa gota se demora para juntar-se ao resto do copo, como se ela realmente não quisesse chegar lá. Interessantes mesmo são essas cores, caramelo, vermelho, sei lá... estou sem paciência para defini-las... apenas saboreá-las... mais um gole... ah! Como uma faca rasgando o corpo... toda a dor que quero agora, é essa dor que me faz melhor, me torna mais justo... sofrer... embalsamar um corpo vivo. A porta bate. Os passos agudos se aproximam do corpo largado à poltrona, de frente à janela. Eles param. Não quero me virar... pra quê? Sei de quem são... sei que ultimamente não me trazem boas notícias, mas eles insistem em falar comigo:

- Marcos...

Só um movimento do copo como resposta. E nem mais à boca consigo consigo levá-lo.

- ...o delegado me ligou hoje... pode ser uma pista... não sei, na verdade, mas quero acreditar...

Essa última frase deve ter sido acompanhada de uma lágrima, com certeza. Pessoas chorando me fazem chorar, mas já gastei todas as minha lágrimas... por essa e outras vidas... tomara que não existam outras vidas... uma já basta, não aguento mais.

- Você não vai fazer nada? - sim, com certeza há lágrimas - Você não pode continuar assim, Marcos... Uma longa pausa me separa dos passos, que por um momento tentam se aproximar, mas desistem não muito longe do início. Ah, como queira que eles viessem até mim e me abraçassem... queria sentir um pouco de calor! Meu corpo já está frio! É esse vento estúpido dessa estúpida janela... como se ela fosse aparecer, como se ela fosse olhar pra mim... como se ela me amasse... não há mais sentido nessa janela se não eu me terminar nela. Ah, minhas pernas já não se movem há tempos... por um momento é bom sentir o sangue correndo por elas e os músculos vibrando... um pouco de trabalho, mesmo que levantar o corpo de uma poltrona já dignifica o homem... mas não suficiente. Ha! o que pode, verdadeiramente, ser suficiente?

Os passos já estavam voltando à porta quando pararam ao o ouvir levantar. Repousou o copo no parapeito e em seguida debruçou na janela aberta. O vento dissipava o bafo de álcool no ar e os pensamentos do médico bêbado. As pessoas parecem tão pequenas, vistas da cobertura do prédio, tão distantes... e se curei uma daquelas pessoas? Tantas passando aqui por baixo e tantas cirurgias feitas, certamente uma delas está ali aos pés do prédio... mas São Paulo é grande... talvez não tenha curado nenhuma delas, talvez nem parentes delas, ou ainda conhecidas... São Paulo é grande, muita gente... ela pode estar em qualquer lugar.

- Marcos? Um tom de esperança saía de sua voz, na expectativa que ele virasse não só a cara, mas o rumo de sua vida. Estava enganada. O chão ficou mais atraente. As cores se misturavam às pessoas. A alma já estava de pé no parapeito, bastava apenas o corpo segui-la. Os olhos cercaram a rua, buscando uma última coisa que pudesse detê-lo... mas a dor era grande demais.

- Marcos?! Acho que ela já adivinhou a minha pretensão. O que tenho que fazer, farei depressa, antes que pense melhor... antes que ela me pare, antes que eu volte a querer viver. Ah, porque a perna tem estar tão pesada assim? Ai! Joelho no parapeito... Como estará a cara dela? Tomara que ela não esteja vendo. Renata...não merece isso. Mas assim é melhor, assim... o quê?

- Marcos! Ela queria correr e pará-lo, mas por um momento o nojo que sentiu um dia por aquele homem lhe veio a mente, no entanto, foi seu marido, o amou antes na vida, tiveram uma filha... ah, por que isso foi acontecer? Não há quem mereça isso, não há! Eu cuidei dela como pude, eu a amava com a minha vida! Talvez o trabalho atrapalhasse um pouco... mas cuidava mesmo assim! E quando não estava, tinha a empregada! Minha irmã, às vezes, também ajudava... Atenção não faltava; eu sabia das notas dela... por sinal, não consegui falar com ela sobre a nota de Português... ela sempre foi bem, mas tirou uma nota ínfima... por quê? Por que não consegui falar com ela? Ela estava distante... saía com frequência, dificilmente sabia onde ela estava, como conseguiria conversar com ela? Os horários também não ajudavam muito... principalmente as horas de sábado... talvez, se não trabalhasse de sábado podia ter conversado com ela, tomado um café-da-manhã que seja... imagina se todo sábado de manhã eu a levar para o Ibirapuera, podemos correr juntas!... Podíamos... o quê? Marcos! Não!

A figura diante dos seus olhos o fez parar. A sua posição era claramente desconfortável (confortável seria já estar deitado junto à calçada, sem dor), mas existem coisas que nos fazem parar... tremer... não ter mais controle sobre os próprios membros...O que é que vira? Sei que meus olhos devem estar um pouco turvos, por causa da bebida, mas a imagem foi bem clara, apenas não conseguia mais encontrá-la no meio da multidão... seria um anjo? Ela me lembra algo... alguém... seus traços, o jeito de andar, de olhar... pra mim... A perna perdeu força e antes mesmo de conseguir subir na janela, caiu para trás. Seus olhos fitavam os céus, o único lugar ao qual se poderia olhar... A imagem era processada na mente e tomava cada vez mais forma definida. Seu corpo, suas roupas, seus olhos, seu rosto:

- Sofia!

Renata, que fizera a pouco os primeiros movimentos em direção ao ex-marido parou ao som do nome proferido. Uma brasa cada vez mais fumegante ardia em seu peito. Por que proferiria aquele nome tão evitado nos últimos dois meses justamente naquelas circunstâncias. O rosto enfim virou, revelando uma vasta barba que não devia ser feita há semanas, mas os olhos tinham um brilho que não se via desde... não me lembro...
O encontro de olhares acalmou as emoções da mãe aflita, que olhava com espanto e curiosidade o homem sentado no chão à sua frente. Pelo tanto que o conhecia - 18 anos vivendo juntos não podem ser desconsiderados - sabia que aquele olhar trazia algo diferente, que não estava presente fazia tempos... esperança.

- Sofia... Assim que as palavras saíram de sua boca, levantou-se da melhor maneira que pode. Desequilibrou-se, mas rapidamente apoiou as mãos na poltrona, impulsionando-o novamente rumo à porta. Passou por Renata, atônita, e saiu pelo corredor. Não se lembrava da última vez que sentiu o frio do piso do corredor - e foi quando descobriu que estava descalço, mas isso não importava - e demorou alguns milésimos a mais para lembrar para que lado ficava a escada... ou o elevador... não, a escada; odeio esperar elevadores. A mão tateando a parede ajudava o corpo curvado a se deslocar até o corrimão da longa escada. Os pés desciam compassadamente e impressionou-se da precisão que apresentavam. Só depois do terceiro lance de escadas que lembrou morar num prédio com quinze, não, dezesseis andares - sendo que seu apartamento se encontrava no último. O fôlego já não permitia descer mais degraus, e por um momento pensou em simplesmente deixar seu corpo descer escada a baixo, aproveitando a gloriosa lei da gravidade e a inércia do seu corpo, já pesado pela inatividade. Seu dedo procurou o botão do elevador... qual era, não sei... acho que o de baixo... droga! Apertei o de cima, raios de botão! Agora sim... agora... Ah, Renata descendo... não queria que ela me visse nesse estado... no estado que estou já não sei há quanto tempo... e que estou fazendo com esse casaco marrom?! Não combina nada com essa calça preta!... Renata... Sofia! O elevador!
Quando Renata terminou de descer o mesmo tanto de degraus que Marcos, já não o via. Via apenas as luzes indicadoras do elevador passeando para a esquerda. Tinha que saber o que ele estava aprontando. Continuou a descer as escadas com resistência supreendente para uma mulher já de meia-idade, mas não tão surpreendente quando se trata de uma mãe à procura da filha.
A descida repentina deu-lhe tontura e tentava apressar os números descrescendo no display do elevador sem sucesso. Apoiou o corpo no espelho às suas costas e procurou refúgio aos olhos no teto, mas o desconforto de ser quem era não saía de seu corpo e contentava-se apenas na figura de sua filha... será ter sido uma ilusão? Agora que o pensamento cruzou sua mente, sentiu calafrios de medo... E se nada mudasse? Tudo voltasse a mesma droga de sempre? Eu, aqui, em trapos, sem trabalho, família... sem aonde saber procurar por uma razão de vida... Se o que dizem é verdade, se a esperança é a última que morre... acho que já morri faz tempo.
O alerta do elevador de que já estava no andar térreo o tirou de sua dispersão, conduzindo, trôpego, às portas de vidro que levavam ao pequeno lance de escadas... à calçada... rua... filha... ela estava do outro lado. Não deu grande atenção às buzinas que o advertiam de sua loucura. Ao chegar do outro lado, vasculhou todos os lugares, pessoas e olhares que sua visão distorcida alcançava. A cada segundo que não obtinha o resultado que tanto esperava, o desespero crescia exponencialmente. O ar faltava aos pulmões e já não sabia para que direção olhava, apenas girava em círculos em meio à multidão apressada. E seu olhar finalmente parou ao reencontrar o de sua ex-mulher, que o fitava ao longe, do outro lado da rua, com o queixo estremecendo e os olhos baixando. Todas as forças que restavam a ele se esvaíram naquele mesmo instante, concentrando-se apenas nas suas lágrimas, no seu pranto alto e patético. Deixou seu corpo cair, como queria ter feito lá de cima, mas a única coisa que lhe aconteceu foi esbarrar com um jovem que, até então, estava desconectado do mundo, envolto pela sua música alta, de olhos baixos e chiclete sendo mascado automaticamente por movimentos contínuos que, por sinal, regiam todo o seu corpo, até sua mente. Os fones caíram de seu ouvido e a mochila de seu ombro. Sua mão tocou o chão; os seus tecidos, que clamavam por algum contato físico verdadeiro, satisfizeram-se ao serem rasgados pelo asfalto: meras células... serão recompostas. O que mais lhe incomodou, no entanto, foi deparar-se com a humanidade que já não tinha, com o choro de um bêbado.

9.12.09

A menina do cachorro

A menina conversava com seu cachorro, sentada na grama da pequena praça daquela pequena cidade sob a sombra de uma grande árvore; discorria sobre qualquer coisa não muito importante e seu cachorro a acompanhava num outro ritmo, constantemente mudando de lugar. Eram conversas divertidas e ele era realmente um bom amigo e sempre quando as lições de casa permitiam, não recusava o momento. O cachorro, por não ser humano, não tinha medo de trocar dezenas de "eu te amo" durante o dia... a menina era tudo para ele e ela retribuía o sentimento (sem, claro, a mesma empolgação).

A árvore sob a qual sentavam cresceu e envelheceu, mas continuavam na sua rotina-não-certa de sentarem para conversar sempre que podiam. Muito embora ela podia muito menos. Sobre o tempo do cachorro, não precisa se discutir... afinal, fora se aventurar a cheirar coisas novas e observar as pessoas passando (de vez em quando latir para outro cachorro), não tinha muito o que fazer. Mas a menina, esta acompanhou o crescimento da árvore e com isso as responsabilidades aumentaram e o tempo começou a ficar mais curto. Não tinha grandes preocupações (nem mesmo pensava muito em meninos) e as conversas esporádicas com o cachorro a faziam lembrar do que era realmente importante. Eles ainda trocavam seus "eu tem amo"s

O cachorro começou a perder o ânimo. Não por dentro, onde sempre se via empolgado, mas o corpo já não acompanhava a mesma alegria e euforia. Mesmo assim, esperava pelos momentos com sua dona, porém mais requieto... ela era tudo para ele. Ela, contudo, virou bela moça, com outras responsabilidades. Gostava do cachorro, mas tinha agora várias amigas e amigos, além de vários outros interesses. Suas conversas eram bem mais curtas, normalmente o cachorro que perguntava do dia dela e tinha respostas breves, quando não monossilábicas. O cachorro, por ainda ser cachorro, não tinha medo de dizer para ela que a amava. Ela retribuía, mas sem o mesmo brilho nos olhos. Ela só ficava novamente empolgada, quando era acompanhada de alguma amiga nas conversas com o cachorro - já consideradas ocasionais - e este, com toda a paciência, suportava ser ignorado por algumas vezes e se contentava com o carinho que ainda não faltava.

Chegou o tempo em que deitar era quase tudo o que conseguia fazer e a própria visão esvaía. Levantou como pode, andou até a árvore já velha e sentou, observando o seu último por-do-sol. Estava sozinho. Muita gente podia tomar essa situação como injusta ou ultrajante, mas gente ele não era, era cachorro. Só agradeceu ter vivido (e da melhor maneira que pode). Amou a vida inteira.

19.11.09

Prática

Só gostaria de relatar como temos tanto pelo que agradecer. Nem percebemos, mas todo momento é um momento novo, diferente do anterior e todos eles nos mudam e transformam, nem que seja num mínimo de um sorriso. E em todos esses instantes estamos vivos, não importa em que estado... Se olharmos para os passos que damos com contentamento, não só aproveitamos o azul dos dias claros, mas também nos regamos com a chuva das tardes cinzentas e nubladas. Vale a pena. Muito.

12.11.09

Relativo

Algo curto.
Sim, com pressa,
sem muito o que pensar.
Algo só para preencher
os espaços que faltam
Entre "entre" e "fim"do fim

Algo só que os deixe contentes,
sem aquele trabalho todo
De mexer e descolar a mente,
Nem precisa fazer sentido!
Só faça,
Faça que eles adoram.

Mas quem sabe, um dia.
Eles olhem para as palavras
como realmente são.

Quem sabe, um dia
não tenhamos que discorrer sobre a verdadeira relevância de versos
[compridos ou
curtos

[Algumas coisas não tem tanto mistério assim]

Quem sabe, um dia
"amor" signifique Amar
E não velha peça de porcelana,
Parte da coleção de seus amados avós

Quem sabe, um dia
O essencial não escape mais aos olhos
E a gente, enfim, poderia
Simplesmente... aceitar.

[A Academia poderia, as vezes, usar um pouco de fé.]

30.10.09

Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E sei que um dia estarei mudo:
- mais nada

(Cecília Meireles)

E lógico que esta poesia não poderia ser minha.

22.10.09

Por mais gago

Que eu seja, formar-se-ão palavras na minha boca.
Talvez sem muito sentido, sem tanta ordem
Mas simples e sinceras... ainda que não fáceis.

Falarei sempre do que me acompanha,
Um pouco acanhado no ínicio, que seja
Mas não envergonhado.

Porque o que de mim vejo sempre perto
Não pode me dar maior alegria,
Sinto só por não fazê-lo caber em palavras.

Mas enquanto eu continuar pequeno,
Cabendo na palma de sua mão
Caberei em ti e me satisfaço
Nas tuas palavras, que em minha boca virão
Não importa o quão gago eu seja

15.10.09

À procura da Arte

Ouviu o homem um sussurro estranho, que entrou por seu ouvido no vibrar de uma frequência estranha, retumbando e batendo estranhamente dentro de sua cabeça, até chegar na mente e se dissolver junto de todos os seus conhecimentos anteriores. O chão parecia frio. Cinza e frio. Mas desenhava o andar de cada pessoa que um dia passou por lá, seus pés, seus jeitos, o que falavam, o que sentiam. O ar estava carregado de história e quando assim percebeu, pareceu-lhe que ia sufocar, tamanho peso e importância do simples ar. Tudo parecia iluminado por igual, e por um momento, todas as pessoas eram iguais. Não em aparência, ou em personalidade (seria muita pretensão afirmar isto), mas algo as unia, como uma necessidade só, de toda a humanidade. Via neles algo que parecia seguir a vida de cada um. Todas as pessoas eram iguais, debaixo de uma só perspectiva.
Em seu momento de epifania, pôs o lápis a sambar e riscar o papel em branco. Mas tudo que lhe saia não expressava em nada o que via. Tentou desenhar, mas a luz era indecifrável e de repente viu-se frustrado por não saber o que era bom ou ruim, o que seria genial como seus pensamentos, ou simples farsa, que passa de um dia para o outro, sem ser importante para ninguém, para momento algum. Afinal, o que é a arte?
Seus anos já não eram tão curtos - tinha filhos, esposa, tios, tias mãe e pai. Já vira tanto que nem se podia guardar: lembrou-se do momento em que fez, pela primeira vez, um importante gol no time da escola. A alegria lhe extasiava e nunca houve mais um segundo sequer que tivera tantos amigos, tantas paixões e fosse tanto amado, como naquele momento em que a bola cruzou, por inteiro, a linha do gol adversário. Pegou-se devaneando na sua primeira namorada e como aquilo lhe causara tamanha vergonha. Mas ao lembrar-se de seus tempos imaturos, sorriu por ter sido um tempo necessário. Veio-lhe à mente, então, o instante que primeiro passara dos limites com amigos no bar, pode revolver o álcool que lhe entorpecia qualquer tipo de pensamento, o movimento leve e lento das mãos, a risada vazia e ecoante, como também o buraco posterior em sua alma - nunca mais faria coisa do tipo... até a semana seguinte. A vida passou mais um pouco, e sua quarta namorada (que viria a ser a sua companheira para o resto de sua vida, a que podemos confirmar) já visitava seus parentes e sentiu-se pela primeira vez intimidade, viu nela aquilo que queria para sempre, mas que por muitas vezes esqueceu que tanto a desejara. O medo de ser pai e segurar no colo a vida a qual dele proviera - e seu esômago gelou. Outros tantos momentos passaram atropelando outros, de modo indistinguível. Conseguiria fazer arte com tudo que já lhe foi oferecido na vida? Seria arte a representação da sua pessoa, em toda a sua abundância? Ou a completa negação desta?
Viu, por fim, um completo desinteresse no humano. Este já não lhe parecia mais atrente e encantador. Soava-lhe um ser tão mesquinho e pequeno, cheio de necessidades e... frágil. Muito do que pensavam era completa estupidez, e diante de todo o seu ser fracassado, embriagavam-se de orgulho e arrogância, negando olhares para aquele que tiveram menos sorte, reclamando autonomia do Universo, e impondo todo tipo de ideologia, como se fossem os verdadeiros inventores da sabedoria. Mas basta uma chuva, um escorregão... e todo pensamento, sorte, orgulho, riqueza, ideologia e sabedoria caem por terra, com o homem debaixo dela. O homem é um ser tão fraco e passageiro. Pode arte sair de suas mãos?
Saiu da escada a qual observava o mundo sem uma respota. Procurou nos prédios, ares, flores e belezas. Definiu, então, que arte é aquilo que agrada o homem - completamente plausível: a arte provoca no ser humano os mais variados sentimentos que lhe causam um certo conforto, lhe deixam morno e lhe inspiram felicidade. Contentou-se com sua conclusão, mas então viu as ruas, a gente, e as casas. Seus olhos pareciam tão diferentes, tantas coisas que lhe pareciam ocultas - e o incomodavam agudamente - sobressairam-se à sua vista e sentiu grande depressão. Definiu que arte deveria confrontar os erros, a falta de respeito e a falta de lugar. Tudo que estivesse errado, deveria ser acusado, em plena corte fantástica, pela arte. Sentiu mais firmeza em sua razão, porém... como unir esta definição à anterior? Olhou para o lado e lá estavam dois bêbados, que em sua gritaria e risos descontraídos, abordavam com palavras todos à sua frente, enquanto andavam pela calçada. Muitas palavras extremamente desnecessárias foram proferidas, porém algumas outras grandemente curiosas, que despertavam revolta. Seria o absurdo também arte? Teria ele lugar junto do Belo, e do Justo? Seria o retrato da incerteza e confusão do homem algo a ser elevado como arte?
A definição que antes lhe parecia certa, agora escapava por entre seus dedos. Até que... Lembrou-se daquilo que ligava toda a humanidade. E tudo pareceu, então, desconfortavelmente claro. Seria uma linda resposta, mas ao mesmo tempo, o desmascaria por completo, deixando transparente para o mundo.
Viu-se, pela primeira vez, totalmente indefeso... encontrou a arte.

30.9.09

só isso, simplesmente

meus dias não são dias,
são semanas inteiras,
que se estendem no limiar do sentido
e se comprimem, bem de perto, no coração

minha gente não é gente,
são pedras preciosas, espalhadas na terra
e pedregulhos cinzentos, duros, frios e calculáveis

meu dono não é dono,
é Senhor, com voz que treme e desmancha
e abraço que remonta tudo outra vez

27.9.09

Resolução de 27 de Setembro

Corei de ver a vida passar. E é incrível como ela consegue ser tão cruelmente bonita!
[Como não queria ver mais dois poemas seguidos, faço qualquer coisa aqui]

Suspiramos tanto e vemos tanta TV, parece que nada nunca vai chegar. Mas aí, um dia chega, e começas a se contorcer pra ver o mundo em 360 graus. Dá vontade de que tudo seja muito mais simples! Muito mais! Afinal, por que não apenas sobreviver (o problema é que só de fazer essa pergunta, já me vem a resposta, clara e óbvia, mas nada confortável...)?
Não sei realmente se é só preguiça.
No fundo, acho que não. É que me atropelaram de um ano para o outro (e por diversos lados). "Atropelar" parece sério demais, mas como não consigo (e não quero) achar outra palavra, fica ela mesma! Vem vários fantasmas juntos, e por mais que você não se desespere... você se desespera! A questão é: fazemos tanto para um dia sermos alguma coisa, mas na verdade não temos como descobrir o que seremos até sermos! Tantas coisas fazem parte de uma vida, cercada de muitas cores, muitos sons. Sempre quando algo te incomoda, há uma outra voz que te chama pra perto e te faz ver as outras cores que não se tornaram cinzas (por um tempo, porque é sempre por um tempo). Às vezes os passos parecem não convergirem para o mesmo lugar, mas o que? Somos ainda jovens e queremos saber o futuro?
O que me incomoda é que algo me incomoda, e não as outras coisas normais de gente normal (às vezes me trato como sendo extremamente diferente, mas pelo tom da minha voz, se vê a ironia e minha normalidade... Mas ser normal não significa que não se possa ter desejos extremamente anormais). Mas não vejo como chegar lá. Mas, pensando bem, eu sou míope, e as chances de eu enxergar ao longe já não são naturalmente boas.
Vamos ver no que vai dar (além de grandes piadas aos netos).

21.9.09

Como se parar o Tempo

Como é, cadê lá?
Vem de encontro, abre mar
Como é, como é?
Abre porta, segura pé
Inda agora, vou me embora
Sai da roda, vai de novo
Cadê hora? Verte e chora
Vá lá, vai! buscar teu povo

Anda hora, vai de novo
Passa hora, cai de novo
Lava mão, levanta e vai
Paga nada, manda e faz
Faz o peito, faz a gente
Mata o medo, varre a frente
Anda o passo, torto e reto
Cadê hora? Mais de perto

Hora mora enquanto quase chora
Hora para pra que o mundo caia
Hora esquece, desfalece
Volta o tempo, fim de lamento

Como é? Vai parado?
O mundo estreito, pouco porte
Vai luzindo, lado a lado
lento e pouco, muito e forte
Cora e cai, joelho bate
Olho a olho, vermelha terra
Peito vai, xeque-mate
Nasce o novo, velho encerra

Anda hora, vai de novo
Passa hora, cai de novo
Lava mão, levanta e vai
Paga nada, manda e faz
Faz o peito, faz a gente
Mata o medo, varre a frente
Anda o passo, torto e reto
Cadê hora? Tem fim certo

14.9.09

Conversa (2)

- E aí? Melhorou?
- Como se você não soubesse... Melhorou sim.
- Sempre sei, mas gosto quando você me fala por vontade própria.
- Obrigado... Fez muita diferença mesmo... Quer dizer, nada mudou efetivamente, mas... Mas, é bom saber que isso tudo leva a algum lugar.
- Só tome cuidado para que leve ao lugar que quero.


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13.9.09

Independência com Morte

Acordei um dia e vi:
Um quarto leve e gostoso, sem luxo, sem maiores decorações, mas tinha sobre mim uma cama, e ao meu lado, armário. Saí pela porta e me deparei com o corredor, pequeno e verde, mas um aconchegante corredor, que dava até a cozinha. A cozinha não tinha nada de especial, apenas uma mesa pequena, geladeira amarela e fogão, microondas, pia, torradeira. Os azulejos eram preto-e-branco. Não estava repleta de comida, mas tinha ao menos um pouco em cada armário marrom. A cozinha dava para a rua. Uma rua com seus buracos e casas não tão elegantes, mas muito enxuta e segura, tinha até um ponto de ônibus. Do ônibus, se viam as casas correndo pela janela, no contraste com os bancos laranjas e piso metálico. Não era o ônibus mais confortável que andei, mas era um bom ônibus. No outro ponto já vi uma nova rua. Essa, um pouco mais estreita, se estendia por meio da nuvem de fumaça dos carros de todos os tipos (menos dos tipos mais caros). Andando por lá, as casas andavam ao meu lado. Se viam suas rachaduras, porém eram casas... bonitas? Acho que sim. A esquina me ofereceu uma nova visão. Dessa vez, as casas tornaram-se menores e mais vermelho-alaranjado. As roupas se estendiam pelos muros e tetos, banhadas pelo Sol. Não era uma visão que me agradava. Felizmente, dobrei mais uma rua. Infelizmente, nem casas vi. Vi quartos: cada qual com sua cama e paredes (algumas compartilhadas), mas as camas eram de papelão, e as paredes não eram deles, que ali repousavam (nem das moscas que os rondavam). Quase fechei meus olhos, mas continuei... não dá pra ficar pior. Vi suas cozinhas. Coincidentemente, pareciam-se muito com onde eu jogava os restos da minha comida. Parei. Voltei. Lixo, beco, papel, lugar, mãos sujas, papelão, tocas, furos, cheiro, largar, casas, tijolos, tijolos e roupas, sol, varal, gato, garrafa, buraco, cinza, grama, morta, carro, fumaça, caras, fumaça, relógio, assentos laranjas, corda, luz, metal, freio, ponto, seguro, árvore, jardim, casa azul, verde, amarela, vermelha, portão, cozinha, corredor, quarto, ufa! Ainda bem que meu quarto continua o mesmo... Não há com que me preocupar...

31.8.09

Vazio

Me peguei lendo algumas coisas que não entendia (na verdade, nos últimos vezes, várias são as vezes que não entendo quase nada do que leio), mas continuei, e continuei não entendendo nada. Algumas parecem estar no limiar de ser algo estrondosamente interessante, mas se desvaneciam num ponto final... e mais nenhuma palavra depois. Sinceramente, não sei se gosto ou não que terminem assim. Por um lado, me agarro a cada palavra que salta aos meus olhos e minha mente voa com elas, deixando-as voltarem aos seu lugar apenas depois de um longo passeio (outra coisa que tem acontecido muito ultimamente); mas por outro, tudo que antes imaginara nunca ia se tornar realidade - e estas são as partes dos sonhos que ainda não consegui lidar... encará-los como sonhos.
Me peguei pensando sobre quem queria ser. Um hiato no tempo, permitindo a imaginação das pessoas voar e flutuar pelo espaço-nada-contínuo. Ou um tempo cheio, onde poderiam ver o que realmente está ali, o que realmente importa. Aqueles que me conhecem, conhecem também minhas prioridades, o que escolho ser.




Afinal, serei [ou seremos] por pouco tempo, muito menos do que podemos acreditar. Mas ainda há aqueles que acreditam num Tempo onde não haverá tempo, e tudo o que desejamos um dia ser, passará do desejar para o contemplar. Há de vir um Tempo, onde o tempo é infinito, e que seremos
cheios,
cheios,
cheios,
não havendo espaço para hiatos.

21.8.09

Conversa (1)

- É um pouco frustrante, sim.
- Ah, o que posso dizer? é um momento...
- Por que todas as minhas histórias tem que terminar bem?
- Ai, ai... É a sua essência... No fundo, sempre terá esperança.
- Ás vezes isso frustra - sorriso de ambos os lados.
- É um momento... Um momento...

13.8.09

Nuvens e distrações

Como serás, amor
A tua vestida?
Que vem sem medo de perecer
Ou se te preza

Me diga então, amor
Como ficar de castigo
Só com meus passos
Como único amigo

E o que dirás, então
Na alvorada que se passa
Pois a vida corre, corre
E não espera nada

...

Faz de conta, então
Que a paixão se fez de amigo,
Sem que o revés do sonho
Se fizesse valer,
O fechar da noite,
Os olhos estremecer

Diz, amor
Que tudo foi sempre igual,
Que a corrida matinal
Aos teus braços nunca aconteceu
Que o meu nunca se fez teu
Nada mais nos iguala

Onde está, amor
O pedaço que você perdeu
Pois um por um dia foi dois
E não se faz mais um
Mas preciso de dois!
Pois meu coração quer bater

...

Terminei minhas razões,
Sem mais a desnudar
Desdobrei-me inteiro em palavras que não são minhas
Naufraguei meu barco no mar
Gostaria, pois, ainda saber
Como noite escura podes trazer
Sendo tu nada mais real que meus sonhos
E meus sonhos falsos feito nuvens

Por um momento,
parecias real

Por sete instantes







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10.8.09

Colorindo os dias

Parece que vai ser assim,
Com o mundo a desenhar
O velho destino já conhecido,
Já visto, vivido e morto.
Se o sangue não tomar gosto,
O que diferencia um dia de outro?
Por que viver,
Se o amargo é eterno?
A chuva dos olhos não limpa mais
O que sara não são palavras.
A vaga esperança de se fazer novo,
Hoje diferente de ontem.
Esta sim,
Tem volta e desapego.
 
Fé.
 
Não se pode mais lavar os próprios pés,
E então? Como fazer?
Não... fazer
Deixar-se feito.


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30.7.09

Uma Lenda

Muita da verdade ainda não se sabia, mas tinha-se a clara impressão que o bebê era de extrema importância. As circunstâncias que envolveram seu nascimento já eram cercadas de mistérios. Uma sábia anciã da aldeia previu a vinda de um menino que os faria livres da opressão do império Paersano - talvez não traria liberdade só para a sua própria aldeia, mas também para toda a extensão da Paersa. Ainda mais, quando um peregrino passava por aquelas terras e encontrou descanso na aldeia, viu a mãe, grávida do menino, e com um largo sorriso profeiriu as palavaras que marcariam seu futuro: "Serás luz para os que já estão há muito perdidos nas trevas; marcarás a trilha para a verdadeira liberdade; sofrerás por todos e ninguém compadecerá de ti na hora de dor."
As ditas palavras encheram de esperança todos os habitantes da região, que se alvoroçavam em histórias para crianças contadas nas fogueiras noturnas. Não demorou muito, grande parte do povo do Reino já se encantava com a ideia de um salvador, e algumas já inventavam feitos heróicos, sem ao menos terem ideia se toda a história era verdade ou se era apenas um mito - na verdade, a maioria do povo apesar de se encantar com a ideia de um libertador, no fundo não acreditava em tudo que contavam, pois já estavam tão calejados de desesperança, que eram incapazes de acreditar em qualquer coisa.
Acontece que mais alguns anos se passaram. E tudo continuou o mesmo. As histórias sobre o tal guerreiro lendário continuavam a entreter as crianças em noites de pesadelos, mas a esperança que por alguma razão aquela história poderia ser verdadeira se desvaneceram pouco a pouco, até morrer no coração de praticamente todas as pessoas... Praticamente.  


Compartilhe os momentos mais importantes da sua vida com quem você quiser.

28.7.09

Sonhos levados

Olhava o dia azul-claro da janela, deitado em sua cama. Mãos entrelaçadas atrás da cabeça e sonhos se entrelaçando atrás dos olhos. Não posso dizer sobre o que sonhava... é secreto. Porém, posso dizer-lhes que se sentou, olhou os tênis e percebeu que um estava desamarrado. Abaixou-se, e ao entrelaçar dessa vez os cadarços, surgiu uma ideia, que o fez pular da cama e sair pela porta do quarto, sempre de olho na janela.

Subiu na bicicleta e saiu de encontro à rua. Pedalou por alguns quarteirões e chegou enfim a uma praça. O coração pulsava junto de seus pensamentos. Procurou por entre as flores, aquela que desejava, mas não estava ali. A frustração correu-lhe pelas veias, mas escolheu não deixar-se abater: pegou outra, talvez não fosse tão bonita quanto em seus sonhos, mas era com certeza a mais bonita naquela realidade.

Montou novamente na bicicleta e saiu rumo ao seu próximo destino. A viagem foi um pouco mais longa (não morava muito perto do centro daquela pequena cidade), mas não demorou muito já estava lá, escolhendo o presente ideal. Ficou satidefito com um belo colar dourado, fino e delicado (como ela), com um pingente em forma de Lua. Era perfeito! Exatamente como ela dizia em seus momentos juntos "O que me faz sempre me acalmar é ver a Lua lá no alto, intocável e vigilante... não há mais nada o que temer". Mas o ideal não pode ser alcançado. O preço era extremamente alto, muito mais do que ele sonhava em pagar. Sendo assim, pediu por um broche em formato de gato, o melhor que pode comprar com o pouco dinheiro que dispunha.

Saiu a pedalar de volta para casa, flor e broche na mão, ansioso em pensar que efeito surtiria sua ideia. Tão ansioso que distraiu-se. Distraiu-se e caiu. A roda derrapou de lado ao passar por um buraco, fazendo pernas, mãos e cabeça darem cambalhotas pelo ar. E sim, broche e flor também. O menino ainda se virou a tempo de ver o broche escorregando para dentro do ralo do bueiro, e foi como se ele mesmo caísse de um penhasco, quebrando o corpo inteiro. Baixou a cabeça em desânimo, apenas para descobrir que rolara por cima da flor, que se encontrava amassada debaixo de sua perna. A vida do menino por um momento desabou, afinal, naquele momento os presentes eram sua vida. E teve vontade de voltar a cabeça aos céus e praguejar contra  mundo inteiro. Não dava para ser assim... tão... tão injusto!

Levantou a bicicleta, pegou a flor amassada no chão e saiu mancando. Deu ainda uma última olhada pelo bueiro, como se na esperança que o broche ainda estivesse milagrosamente por ali. Não estava. Foi levado pelas águas, assim como todos os seus planos, devastados. Chegou em casa admitindo derrota e foi lentamente para o quarto da irmã doente. Ele não percebia, mas já caiam lágrimas dos olhos, que permaneciam baixos, guiando apenas os pés, reparando em cada detalhe do chão, como se em algum lugar houvesse uma solução. Chegou na porta e segurou a maçaneta, parando por uns instantes, ouvindo seu próprio respirar. Abriu a porta já dizendo:

- Desculpe! Eu tentei fazer o meu melhor, fiz o que pude... mas eu tropecei... levou tudo... não consegui... - e esperou.

- O que você está dizendo? Eu adorei! Obrigada...

O menino, surpreso, levantou os olhos pela primeira vez e viu: a flor favorita dela, junto do broche em formato de Lua... estava tudo lá, por algum motivo...

16.7.09

Sem título

Os jardins ensaiam em sua beleza
O cantarolar de pássaros, abelhas
Rompendo junto de Sol e Lua
Vida entoada, alegria conjunta

De todo o céu e seu espelho abaixo
A Terra e o Ar adentram no compasso
Choro aflito cessa a te presenciar
Manifestação sem qualquer altar

De felicidade envolta, antes perdida
Bendizendo a mão que outrora não sentia
Lhe colher os pés no mais alto lugar
De ondas ao longe sinto o respingar

Do forte vento medo não mais tenho
Pois não caio, apoiado em teu intento
Porém minh'alma salta leve a cantar
Razão minha, mestre do meu respirar


3.7.09

O Baile de máscaras

Um dia me disseram: não confie em suas próprias palavras.
O problema, é que eu confiei.
Elas chegaram, todas em exuberantes vestidos, colares de prata e ouro, pérolas nos pulsos, me dizendo tudo o que queria ouvir. E, ao proferir as primeiras palavras (para me vangloriar, claro), alguma coisa estava muito errada. Elas pareciam combinar com o ambiente, com as luzes, o palco, a platéia, mas alguma coisa nelas... não era a cor, era outra coisa, elas estavam estranhas... elas simplesmente não estavam no tom certo. Saíram todas confiantes, dançantes, mas aqueles que entendiam do assunto não se enganavam e viam que eram grandes farsas, sem sentido, sem... recheio, por assim dizer.

Não era para ser assim.

Juro que não fiz por mal, eu... não sei, pareciam extremamente propícias, eu...
Corri para o maestro que regia uma música que eu nem mesmo ouvia e clamei-lhe "Por favor, mude o tom! Mude o tom! Não sei o que fazer, elas não estão no tom certo, não era para ser assim, eu queria de outro jeito, juro! Eu as vi dançando escadas abaixo e cantando numa melodia que... estão exatamente como imaginei... O senhor deve estar errado, o senhor..." E, então, ouvi.


[a música...]


Meu rosto tornou-se vermelho e senti vergonha do meu terno. O que estava fazendo ali? Aquela música era perfeita, trazia as exatas notas carregadas cada uma de tamanha harmonia, como se todas as outras músicas no universo fossem meras tentativas de a imitar. Cada som (e pausa) trazia consigo todo o sentido contido em toda Terra. Todas aquelas vezes que você se alegrou porque não havia fila para comprar o café, toda vez que seu time fez um gol ou que o seu amor o beijou. Estavam todos contidos ali (e muito mais, eu só não sei descrever o mundo inteiro num texto...)
Olhei de novo para minhas palavras, dançando em volta dos convidados, ao redor dos gigantes lustres de vidro. Algumas pessoas as admiravam e até soltava-se umas palmas de vez em quando, mas... o que mais? eram bonitas, mas... o que é isso, comparado ao mundo?
Minhas mãos embranqueceram, e lágrimas chegaram aos olhos.
O dono da música me passou um papel.
"Por que não tenta agora, partindo da minha música... só acompanhe!"

Digo que... foi tudo diferente.
Acho que nunca mais fiz palavras tão belas quanto as daquele dia. E, para ser sincero, não gostei de todas as que fiz desde então. Algumas tem rugas, outras machucados, umas até saem suaves e graciosas, loiras e temerosas (daquele tipo fácil de se apaixonar...), mas nem todas são assim (e de certo, nenhuma carrega o peso das jóias daquelas princesas de outrora). Mas, vem cá... não somos todos assim? imperfeitos... e cheios de sentidos que nem imaginamos? Para uma palavra ser carregada de sentido, ela tem de ser humana. Pois, como falarei a humanos, dizendo palavras de príncipe? Quem as entenderá?
Só se pode chegar a um humano, de forma... humana.
Um Deus relacional só existe, se um dia ele foi humano...

25.6.09

Cantiga

Martelar e soldar o prego
Soltar o coração na mata
Viver o que se diz que é Belo
Moer a escuridão inata
Manter o que te carrega
Soltar os olhos no claro
Erguer bandeira de guerra
Morrer para o que se diz errado
Saltar troncos de palmeira
Soltar os pés no chão mole
Correr ao longo da ribeira
Verter o céu azul num gole

Dançar a música num ato
Seguir os belos acordes
Dormir como papel dobrado
Deixar que o reino te molde
Tocar a mão de quem ama
Seguir os pés de quem sabe
Saber: sozinho não se alcança
Doar o coração em partes
Viver mais que sobrevida
Sentido em todos os passos
No pequeno se inicia
Seguir o Grande no compasso

A dança que é dança só dança
Quem um dia os pés lhe entregou
Pois vida só é vida pra quem vive
Não por si, mas pelo eterno amor

20.6.09

Morte de todos os dias

Tinha uma vida normal. Estudos, trabalhos, amigos, e tudo o que uma pessoa normal teria. Mas uma coisa o diferenciava dos outros: Às noites, tinha encontros com a morte. Não todas as noites, mas boa parte delas, se sentava na cama e esperava ela vir, e na maioria das vezes já sabia que ela viria aquela noite, pois seu cheiro chegava antes que sua presença. Algumas outras vezes, ela que esperava por ele, e sempre que se encontravam, o semblante dele tornava-se sério, abatido. Não chegavam nem a se tocar, e só algumas vezes eram necessárias trocas de palavras (se um dia encontrares com a morte, verás que a presença dela já fala por si só):
- Sabes, amigo, seu lugar é comigo... não mereces vida...
- Não sou amigo, não marquei encontro...
- Mas quis...
Seu descanso era no dia, pois a noite o incomodava e desgastava sua alma. E quanto mais longe da noite ficava, mais tranquilo estava seu coração. E aquelas noites em que ela não vinha, aí sim ele desfrutaca do sono, da paz, e porque não de amor...
Um dia, aproximando-se do quarto, sentiu seu cheiro peculiar, doce e venenoso. Sentiu raiva e cerrou os punhos. Não dava... Não dava para continuar assim... bateu o pé e seguiu em frente, quando abriu a porta, paralisou. A morte vinha no seu mais ludibriante disfarce, e o seduzia a uma conversa. Os olhos dele fitaram-na por mais alguns instantes e depois escaparam ao chão. Muito se passava na sua cabeça, e a lógica não mais o acompanhava. Até que um grito de socorro de uma alma aprisionada dentro dele se ouviu, nos ecos do grande buraco que aquele venenoso encontro lhe cavava todas as noites em seu coração. E da primeira vez que o som fez-se ouvir, os olhos se fecharam bem apertados, acompanhados das mãos (e da mente), e depois de passados alguns minutos, se abriram em fogo, encarando a morte com a demanda que tanto quisera quando são: "Sai..."
Ela o olhou, assutada, e tentou soltar um riso despreocupado, mas a apreensão já lhe tomara de vez. "Sai, ou..." - a ameaça se repetia.
- Ou o quê? - desafiou-o, curiosa. Mas assim que se deparou com a resposta, suas mãos seguraram-se no apoio mais próximo para não se desequilibrar, e saiu em disparada pela janela, sem antes tropeçar num tênis jogado no chão.
Assim que ela saiu, o silêncio tomou o lugar ocupado antes por tensão, e o ar ficou leve. Sentou na cama... e chorou, chorou pelos buracos já feitos na sua alma... Até que um outro cheiro entrou no quarto, e, olhando para cima assustado, teve um novo encontro com um novo alguém, que dizia "todo buraco pode ser tampado..."

"O Amor é mais forte do que a morte" Ct 8:6

17.6.09

...

"Lights will guide you home
And ignite your bones
And I will try to fix you"

Ainda bem que tem alguém que não desiste...

12.6.09

Recomeço

sub m 1. Parar de mentir para si mesmo e perceber que já é hora 2. Quando há indignação sobre seu próprio ser, mas amor a ponto de se deixar merecer melhoras 3. Parar a caminhada e observar os seus passos errados, mirar na direção daquelas conhecidas pegadas e segui-las para onde realmente se deve ir 4. Perceber que não se tem mais forças para tentar fazer o bem, vendo em si mesmo as mais horrendas marcas que jamais em sã consciência queria se causar (mas as fez... mais de uma vez) e se render por completo, morrendo mais uma vez para si mesmo 5. Popularmente conhecido como Perdão

"Aquele que pouco perdão recebeu pouco amou... Quem muito ama, muito foi perdoado." 

8.6.09

Alguns Fios Soltos

Entender o que se passa. Que essas letras, essas simples letras, essas mesmo que passam rapidamente por nossos olhos, cada uma delas, cada uma foi separada. E no desespero de se fazer o certo ou o não-errado, algumas escapamh e cfausamj congfusãob.

Acabei de escrever mais algumas, mas já as apaguei e nunca mais se saberá o que existiu nesse mesmo espaço.

Tenho que dizer: as coisas nunca fizeram tanto sentido.

Por mais que fujam
Não se perdem
Pois cada uma delas
Correu para onde devia ir

Para sua cama,
Seu repouso,
Pra depois partir.

As letras se encaixam no mais ordinário gesto. Num simples comando de voz. Voz inaudível, devo dizer. Mas uma voz que carrega as palavras num rio de harmonia, um rio sem aparente direção, mas que vai exatamente onde pretende: para todos os lados.

Tenho que dizer: vidas mudam

E elas inundam,
Carimbam,
Não respeitam.

Ainda bem

Se fazem de bobas,
Entorpecem, obedecem
E não temos mais chance

Ainda bem

E assim se fez um simples raiar de dia. Sorrisos molhados de olhos tropeçavam-se uns nos outros. Não se sabe dizer o que existia ali, vi somente gente, mas senti mais. A música enchia o ambiente e o coração. A cabeça não mais funcionava, porque nada mais a preocupava, apenas queria curtir a alegria. Os pés? Ah, eles já dançavam sozinhos (E para aqueles mais acanhados,  pelo menos marcavam compasso com batida no chão). Algumas confissões (de amor, lógico). Nenhum rumor ou dúvida. Agora, entendi.

Só se entende, quando se conhece o Dono das Letras

5.6.09

Graça

O vento estava estático e não se ouvia quase nada, com exceção de dois pássaros que se cantarolavam quase apaixonadamente. O céu estava claro e sem nuvens e, com o calor do Sol batendo em seu rosto, moveu-se em direção ao trabalho (afinal, o tempo não parou por sua causa). Passou por uma árvore. Altiva e bela, erguia-se ante o teto azulado. Percebeu nela algo que o acompanhava também, que o fazia crescer, não importa os invernos que chegassem. Soltou no ar um sorriso e marcou passo. Estava vivo.

3.6.09

(des)Graça

Acho incrível como pontos conseguem se divertir! Tem tanto o que fazer, e se é tão pequeno. Mas mesmo assim... Há música, mesmo que não se mereça. Há goiabas, mesmo que seu gosto seja tão supremo. E os pontos aproveitam, sem nem perceberem seu tamanho. O quanto se é permitido e o quanto se torna pura insolência?
[...]
Sou um ponto
A mim foi-me permitido viver. E muito mais.

Só não me deixo.
Desleixo.

Mato-me por dentro, mas não quebro as barreiras.

Quebre-as por mim...

29.5.09

Significado de um suspiro

Chega de desejo
Quero mais é descansar
Ver o Sol sem medo
Ter no céu o meu lar

Ser não eu mesmo
Atravessar pontes em Veneza
Cruzar espadas à esmo
Viver cercado da Beleza

Rimar só porque quero
Sentir o frio do caloroso chão
Brincar sem ser criança
Mentir mundos ao coração

Desbancar vilões em massa
Passar tarde em relva apaixonada
Domar rios, tormentas
Faltar no mundo quase nada

Que não se vê, não se sente
Ouve só no silêncio atento
"Lágrimas nunca mais"
Diz, carregada pelo vento

26.5.09

Descomplicar... e pronto

- Por quê?
- Porque é simples
- Simples?
- É... como um abraço. Você só precisa se decidir se quer ou não abraçar e... abraçar
- Como um abraço? Mas não é nem um pouco mais complicado? Jurava que era complicado...
- Todo mundo acha. Mas é simples: Eu te amo e pronto. Te quero aqui... perto.
- Assim? Eu? Certeza?
- Hehe, certeza... Não pense em mais nada. Eu te amo e pronto. É só o que você precisa saber.

18.5.09

Já os segundos

Se fizeram inesperadamente. Posto no chão (graciosamente, devo falar, e em todos os sentidos), sentiu finalmente os pés e os dedos. Via agora que quem o atacava era ele mesmo, e atingindo agora a razão, não sabia mais o porquê. Mas sabia que assim que os pés encostaram na grama, madeira, mármore, seja lá o que for, a cabeça já deu uma escapadinha até as nuvens (agora que não havia mais mãos a impedindo, tinha que aproveitar). Tudo tinha o mesmo cheiro do velho, das coisas que já se conhece, e percebeu que ainda não era hora para se fazerem novas todas as coisas, mas que se podia fazer muito com as antigas.
De papel e lápis na mão (velhos), começou a usar todo Ele, todo seu, na dança onde rapidamente se mistura o negro com o branco. Voltou a sonhar.
Percebeu que não só tinha permissão, mas era a coisa mais sensata do mundo fugir por uns tempos do próprio mundo.

Um dos primeiros encontros

Me encontrei com o medo
Não esperava
Nem eu, nem ele

Cercou-me com as mãos
A minha falta de respiração
Cegou os olhos

Dedos meus escorregavam
Diante do rosto do inimigo
Meus pés não alcançavam
(Nem o chão, nem ele)

Culpa

Um tempo rápido
Mais curto de todos
Girando o mundo
Nos devidos agouros
Matando estandarte
Do suave planar
Pregando a morte
No simples andar
Definhando o mundo de sua visão
Adeus, sombra, tortura em vão

30.4.09

Amor

Pensei em escrever milhares de coisas sobre esse último agradecimento do mês.Vieram-me várias, sim, mas nenhuma é o suficiente, ou parece que nenhuma consegue descreve-lo ou chegar a sua grandeza. Não sei... É uma coisa que ainda não consegui explicar direito (talvez nem perto do "direito" estou), mesmo com inúmeras teorias correndo por entre minha mente, algumas descobertas dia a após dia, mas o Amor continua sendo uma coisa tão extensa, inexplicável... louca, na verdade.

PS: Sei que estou quebrando a jura que fiz no primeiro dia de Abril, mas por ser um tema que rompe barreiras, me senti na obrigação de romper algumas.

...
Talvez... não, ainda não...


Hum... primeira coisa, você pode estar pensando que não é tão complicado assim, mas talvez você tenha por referência o amor e não o Amor (e sua diferença é bem maior que apenas a letra maiúscula). O primeiro, podemos sentir num momento, e no outro temos a sensação de desaparecer quase que completamente. O segundo, não se trata muito de "sentir"... como vou explicar... é mais uma questão de opção, um princípio imposto em sua vida que, não importa o momento que você passe, faz com que você ame (não "sinta" amor, mas ame). O primeiro é geralmente utilizado pra tentar expressar um sentimento por um outro alguém (alguns ainda sismam em usá-lo para objetos, mas no fundo todo mundo sabe que não é possível). O segundo, usa-se para expressar a Vida e todas as suas situações (inclusive o "outro alguém").

Mas, por incrivel que pareça, o problema maior não é a definição... É como fazer pra ter esse Amor, capaz de mudar completamente cada olhar, lembrança, palavra, silêncio, sorriso, manhã ou noite. Fazer de cada momento seu, um momento intensamente vivido, de forma que tenhas CERTEZA, que não precisas de mais nada, que toda a grandeza que existe no mundo já foi alcançada da maneira mais inóspita possível... pois realmente, nada tem valor algum, quando comparado ao Amor. Uma dica: o Amor, é humanamente impossível...

"Ainda que eu falasse a língua dos homens e anjos[...] e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda tivesse toda a fé, de maneira a tal que transportasse os montes[...] e ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada seria" - 1 Coríntios 13:1-3

Obrigado, Deus, pelo Amor, que não foi feito para que se entendesse, mas para que fosse compartilhado (maravilha das maravlihas).

23.4.09

Olhar



"'It`s magic', she says to me
My hand in her waist as she approaches sweetly
It`s enough when I see that look in her eyes,
It`s enough for me to paralyse"
Breakdown - Mae

"por entre os chapéus-cocos ele divisou um par de olhos. E os olhos expressaram o inadmissível. Eles reconheceram o senador, e tendo-o reconhecido, fizeram-se furiosos, dilataram-se, acenderam-se e brilharam"
Petesburgo - Bieli

"Digory fechou a boca e apertou os lábios. Seu mal-estar aumentava. Tinha a esperança que, acontecesse o que acontecesse, não choramigaria, nem faria nada ridículo.
- Filho de Adão, está disposto a desfazer o mal que fez ao mru manso país de Nárnia no dia do seu próprio nacimento?
-Só não sei como posso fazer. Como o senhor sabe, a rainha fugiu e...
-Perguntei se está disposto - disse o Leão.
-Estou.
Passara-lhe um segundo pela cabeça a tentação boba de responder: "Estou disposto, se o senhor prometer ajudar a minha mãe." Mas percebeu a tempo que o Leão não era criatura com a qual se podia fazer barganhas. Porém, quando disse "Estou", pensou na mãe, nas grandes esperanças que tivera, e em como agora elas estavam para morrer. Sentiu um nó na garganta e lágrima nos olhos. Deixou escapar, no entanto:
-Mas, por favor, por favor... o senhor não podia me dar qualquer coisa que salvasse minha mãe?
Até aquele instante, só olhara para as patas do Leão; agora, com o desespero, olhou-o nos olhos. O que viu o surpreendeu mais do que qualquer outra coisa. Pois a face castanha estava inclinada perto do seu próprio rosto e (maravilha das maravilhas) grandes lágrimas brilhavam nos olhos do Leão. Eram lágrimas tão grandes e tão brilhantes, comparadas às de Digory, que por um instante sentiu que o Leão sofria por sua mãe mais do que ele prórpio"
As Crônicas de Nárnia: O sobrinho do mago - C. S. Lewis



Obrigado, Deus, pelo olhar seco ou úmido, por sentir as pessoas a sua volta sem se quer necessitar saber quem são. Por mergulhos inesperados nos outros, pelo frio na barriga por causa de um, um encontro de olhares. Pelo olhar-para-baixo (obigado), e principalmente olhar-para-cima. Por saber que existem coisas belas e comprová-las da maneira mais rústica e simples possível, por perceber que o mundo não é um acidente e cada um é único, diferente, e belo em seu próprio jeito. Por perceber quando se arrepender, o que não ser e expressar o 'querer ser'. Obrigado pelo toque dado a grande distâncias, pelo algo a mais que palavras não puderam dizer, por fazer o íntimo se remexer, seja de raiva, amor ou choro. Pelo choro (ou se quiser, limpeza do orgulho). Pela expressão única capaz de alcançar o até então inalcançável. Obrigado.

14.4.09

Esquecimento

"I'll pay for you anytime,
I'll pay for you anytime"
Bloc Party - This Modern Love

"The battle is won
With all these things that I've done"
The Killers - All these things that I've done

Obrigado, Deus, por esquecer... todas as coisas que fiz, tão ruins, já esqueceste, não lembras mais.

9.4.09

Saudade


"Um dia a maioria de nós irá nos separar. Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, as descobertas que fizemos. dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que compartilhamos. [...] Vamos nos perder no tempo... Um dia nosso filhos verão aquelas fotos e perguntarão: Quem são aquelas pessoas? Diremos... Que eram nossos amigos. E... isso vai doer tanto! Foram meus amigos, foi com eles que vivi os melhores anos da minha vida!" - Fernando Pessoa


"E se eu te troquei,
Não foi por maldade;
Veja bem, meu bem,

Arranjei alguém
Chamado saudade"
Los Hermanos - Veja bem, meu bem

Obrigado, Deus, pela saudade. Pois por mais que não possamos carregar aqueles que amamos juntos de nós, podemos carregar as lembranças suas, bem perto. Obrigado por esse sentimento que nos faz parecer um pouco mais vivos e que é capaz de despertar sorrisos nas horas mais inesperadas... Ah, saudade. Obbrigado.

7.4.09

Silêncio




...


Estar só, em silêncio...


...


Obrigado, Deus...

" I´ve got nothing to say
I´ve got nothing to say
I´m in utter dismay
I´ve got nothing to say

Hearmless children,
We name our soldiers after you
Don´t be a coconut
God is trying to talk to you"
The Strokes - Ask me Anything

5.4.09

Manhã


"Não importa se o dia tá de dia,
se o dia tá de tarde, se o dia tá de noite
Pra começar ao levantar: cantarolar
O sol que dá o tom
Um recomeço mais belo desvela o meu olhar
num outro lugar

Onde não exista noite
Onde nada mais me açoite
Onde nada mais me prenda
Onde não me há contenda

Quando é de manhã, o dia é mais bonito
Quando é de manhã, o dia é infinito
Quando é de manhã, o galo canta
Quando é de manhã, eu sei por qual caminho eu vou seguir

Quando é de manhã, a noite vira dia
Quando é de manhã, nego sente uma alegria
Quando é de manhã, o galo canta
Quando é de manhã, eu sei por qual caminho eu vou seguir"
Crombie - Quando é de manhã

Obrigado, Deus, pela manhã. Porque não importa o quão pesado posso ter dormido à noite, a manhã nos deixa leves, com chance de recomeçar e recomeçar bem. Obrigado.

3.4.09

Sorriso


"Where do we go nobody knows
I gotta say: I`m on my way
God gave me style and gave me grace,
God put a smile upon my face"
ColdPlay - God put a smile upon my face




""It`s fragil" she said to me.
The hair in her eyes,
she removes it smiling"

Mae - Breakdown




Obrigado, Deus, pelo sorriso, o sinal mais belo num tempo de traições; podendo significar o Mundo, ou significar apenas a pura simplicidade da vida; primeira esperança de um apaixonado, dizendo mais do que se pode ouvir; agrupando todas as forças do universo num único gesto, e com isso, alimentando todo o universo. A única forma de se alimentar a alma em tempos de aflições, e elevá-la aos céus. Obrigado pela arte de sorrir, e por ter artistas que o fazem muito bem.

2.4.09

Letras



"Então ele com um pequeno pau rabisca na poeira do chão: "AZUL". Fica a olhar o desenho, com a cabeça inclinada sobre o ombro. Afinal, ele também sabia escrever? Averiguou as mãos quase com medo. Que pessoa estava em si e lhe ia chegando com o tempo?"
Mia Couto - Terra Sonâmbula




Obrigado, Deus, pelas letras, as formas abstratas de sentido mais concreto na vida, trovadores prórpios, solitários (talvez nem tanto) e auto-suficientes (na verdade, apenas MAIS suficientes do que os homens, mas não deixam de ser dependentes). Obrigado pelas palavras simples (as que mais gosto por serem mais fáceis de entender) e pelas complicadas (as que mais me intrigam pela curiosidade de entendê-las). Obrigado por Drummonds, Lewis, Tolkiens e Bandeiras. Obrigado pela alegria e fantasia de cada dia. Obrigado, obrigado...

1.4.09

Noite

hoje decidi: esse mês, irei só agradecer. e não vou escrever nada meu (pelo menos não aqui). vou só citar músicas, fotos e textos alheios que falam muito mais que qualquer palavra minha. não vou escrever nada que não seja agradecimento, e começo (um tanto empolgado, na verdade) com uma foto roubada de um blog com várias fotos interessantes, que retrata uma coisa (ou fenômeno) que me acompanha a vida inteira sem eu perceber, e que ultimamente descobri que gosto muito, muito mesmo.


Muito obrigado, Deus, pela noite...

31.3.09

Campo dos Sonhos

O mundo entoa uma canção morta;
Esperam pelo impossível, vindo do homem;
A multidão quer o Romantismo heróico;
As pessoas querem acreditar em Cândido e Martí;
Querem ter letras bonitas e céus límpidos;
Querem e precisam ter fé;
Mas há sempre Natalis no mesmo mundo,
Dizendo que a tera é seca e o céu nublado;
Dizendo que o líquido tem que solidificar-se;
Querendo enraizar em razão aquilo que não é racional;
Querendo apodrecer os sonhos dos homens,
A vívida sensação de acreditar no melhor.
Há, ainda, salvação.
(É necessário salvação)
Os desejos não podem cessar simplesmente porque homens clamam sua inexistência;
Os céus não deixam de ser límpidos apenas porque homens clamam que são nublados;
Há de ter um jeito;
Haverá um lugar
Onde a louca fantasia da criança não será dominada por correntes, por ninguém;
Onde é possível não somente sonhar, mas viver o que se sonha;
Um dia não seremos mais presos,
presos por nossos medos,
nossos erros,
nossa incapacidade de esperar;
Um dia.
Em um dia, todo amor derramado não será frustrado;
Não mais lembraremos do amargo e turvo veneno da injustiça;
Poderemos viver plenamente satisfeitos;
Eternamente satisfeitos.
O mundo precisa de fé.
Fé e mangas arregaçadas.

"É preciso ter fé no melhor do homem e desconfiar do pior dele. É preciso dar oportunidade ao melhor para que se revele e prevaleça sobre o pior. Senão, o pior prevalece." - José Martí

"Porque, eis que eu crio novos céus e nova terra; e não haverá mais lembrança das coisas passadas, nem mais se recordarão." - Is 65:17

"E vi um novo céu, e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe." - Ap 21:1